Cartão-postal

O projeto mais recente ao qual tenho me dedicado é sobre Cartões Postais. Jacques Derrida, em seu livro O cartão-postal: de Sócrates e Freud e além, escreve: – Nós praticamos o cartão-postal contra a literatura […] O que prefiro no cartão-postal é que não se sabe o que está na frente ou o que está atrás, aqui ou lá, perto ou longe, o Platão ou o Sócrates, frente ou verso. Nem o que mais importa, a imagem ou o texto, e no texto, a mensagem ou a legenda, ou o endereço.

No ano que vem acontecerá o IV Colóquio Internacional Estéticas no Centro: Estéticas das Viagens, em Brasília. Juntamente com meus colegas artistas, professores e pesquisadores, Odinaldo Costa e Wolney Fernandes, estou propondo um painel temático intitulado A viagem nas práticas artísticas autobiográficas. Abaixo, segue o resumo do artigo que estou preparando neste momento para o painel, projeto ao qual me dedicarei até meados de julho de 2021.

Cartão postal: vestígio e testemunha das passagens

O objetivo deste trabalho é refletir sobre o cartão postal como gênero de escrito de viagem que toma forma na confluência de imagens, textos, carimbos, selos e distâncias percorridas por uma pessoa – a remetente – em trânsito. Discuto os usos do cartão postal na vida e na arte, observando seu papel como dispositivo que ora reforça ora se contrapõe a discursos hegemônicos. Philippe Lejeune afirma que uma carta é um objeto de troca que começa pertencendo à remetente e, depois, é transferido à endereçada pelo ato da postagem. O cartão postal, no entanto, não necessariamente estabelece uma troca, uma vez que a remetente está em deslocamento, sem endereço fixo. Ao enviar um cartão postal, a viajante exercita a própria postagem como ato de presença certificado pelos carimbos dos correios. Ao reivindicar seu existir em deslocamento e enviar a alguém seu próprio devir, ela revela sua localização temporária por meio de fragmentos de paisagens e relatos das experiências em trânsito. Assim, o cartão postal deixa um rastro de um percurso, de um ‘aqui’ que já se moveu, tornando-se vestígio e testemunha das passagens. Este texto está dividido em quatro partes. Primeiro, reflito sobre o cartão postal como escrito de viagem no âmbito dos estudos autobiográficos, especificamente a partir do gênero ‘correspondência’. Em seguida, em diálogo com a geografia humanista de Yi-Fu Tuan e a geografia feminista de Doreen Massey, discorro sobre os elementos textuais e visuais do cartão postal que reforçam emblemas de poder e narrativas coloniais. Na terceira parte, investigo os usos do cartão postal na produção de artistas como On Kawara, Susan Hiller, Paulo Bruscky e Anna Bella Geiger, observando em seguida como este escrito de viagem aparece em minha própria produção artística. Por último, percorro minha coleção de cartões postais composta por exemplares datados desde o ano 1900 para demonstrar os inúmeros tipos de viagem que um cartão postal pode fazer.

Palavras-chave: Cartão Postal; Artes Visuais; Autobiografia; Decolonialidade